Promovendo a Integração e a Colaboração:
Transformando conflito em aliança entre empresas
Duas empresas tinham uma relação cliente-fornecedor onde uma dependia da outra. Era uma relação que envolvia milhares de pessoas e centenas de milhões de Reais. Esta dependência mútua poderia ter estreitado a parceria, mas ao longo do tempo exacerbou o conflito.
A cliente pressionava a fornecedora para investir mais para melhorar a qualidade do serviço, enquanto a fornecedora pressionava a cliente a pagar mais por ele. As relações entre elas, do topo até em baixo, foram se desgastando, até que a situação se tornou insustentável: a qualidade do serviço bateu seu nível mais baixo, a cliente gastava cada vez mais e a fornecedora lucrava cada vez menos.
Era uma situação perde-perde, mas não conseguiam sair disso sozinhas pois a confiança era muito baixa de ambos os lados. Para cada uma, a culpa de tudo era da outra. Nesta situação começou o meu trabalho.
O primeiro passo foi entrevistar a alta liderança das duas empresas para entender os diferentes pontos de vista. Com o resultado das entrevistas foi projetado um primeiro workshop de um dia e meio de duração com os cinco principais líderes de cada uma das empresas. E este Workshop foi a primeira semente da transformação de todo o sistema.
Planejei o Workshop em cinco estágios: acreditar que era possível mudar, despertar a competência essencial para a mudança, praticar a empatia sobre o problema real, entender as dores de cada um e planejar a cura conjuntamente.
Primeiro estágio: acreditar que era possível
Comecei mostrando citações coletadas nas entrevistas que apontavam a falência da relação. Sem mostrar os autores das citações, perguntei se podiam identificar quem disse o quê. Eles disseram que não, pois todas essencialmente diziam a mesma coisa. Quando revelei a empresa autora de cada frase, perceberam que pelo menos em algo todos eles já concordavam -- a necessidade de mudar.
Mostrei em seguida citações novamente sem o autor divididas em dois grupos: algumas criticando a empresa fornecedora e outras criticando a empresa cliente. Perguntei a eles novamente quem eram os autores e eles disseram que aquela era fácil – era um lado criticando o outro. Ficaram muito surpresos quando mostrei que não. As citações eram exemplos de que existia alguma autocrítica em ambos os lados.
O terceiro conjunto mostrava citações de autoria de uma empresa, revelando as preocupações com a situação da outra empresa. Mostrou a cada uma que, embora o conflito fosse o padrão do dia-a-dia, existia pelo menos algum grau de interesse de cada uma sobre o sucesso da outra.
Esta metodologia mostrou às duas empresas que não só o presente não interessava a ninguém, mas, mais importante, de que havia a possibilidade mudança de ambos os lados.
Segundo estágio: despertar a competência essencial
O próximo passo foi provocar uma discussão entre todos sobre qual era a habilidade individual mais importante para o sucesso daquele Workshop. A resposta que eu esperava surgiu imediatamente: saber ouvir. Aliás, mais do que ouvir, escutar. Conversamos então sobre o que cada um deveria fazer para ser o “excelente escutante” necessário: olhar a pessoa enquanto fala, ter interesse genuíno, evitar conclusões prematuras, fazer perguntas de esclarecimento, etc.
Para que as habilidades de escuta fossem experimentadas, montei duplas com uma pessoa de cada empresa, e os convidei a se entrevistarem por 15 minutos sobre algum dos temas que eu os ofereci (aspectos pessoais que impactam a vida profissional). Eles nunca haviam parado para se conhecer, e fazia anos que não paravam para de fato ouvir o outro! Durante as entrevistas a energia da sala ganhou vida. Ao final, dialogamos e refletimos sobre a experiência.
Com isso, ficaram prontos para iniciar a conversa sobre o problema real.
Terceiro estágio: praticar a empatia sobre o problema real
O próximo exercício foi de prática de empatia sobre o problema real. Reunidos em um grupo de cada empresa, responderam a 3 perguntas: se eu perguntasse a outra empresa como ela se sente sobre nós, o que ela diria? Se eu perguntasse por que ela se sente assim, o que ela diria? Se eu perguntasse o que ela têm vontade de fazer a partir deste sentimento, o que ela diria?
Cada empresa então compartilhou com a outra as suas respostas, e a outra empresa tinha que avaliar para cada item o quão bem ela se sentiu compreendida.
Ao final das duas apresentações, cada empresa deu as suas notas de avaliação sobre o quão bem o outro lhe compreendia, e as notas abaixo de nove foram motivo para um pouco de diálogo sobre o que cada uma de fato sentia e pensava – já se preparando para o estágio seguinte.
Quarto estágio: entender as dores de cada um
O próximo passo foi a oportunidade de cada empresa falar de si mesma, sobre os seus pontos de dor (suas dificuldades, fraquezas e frustrações) em relação ao negócio e à relação entre as empresas. Cada empresa preparou mais uma vez em grupo o seu material.
Antes do compartilhamento, eu os orientei a como expor o seu ponto de vista de uma forma que facilitasse a aceitação do outro: ter a intenção de se fazer entender e não de convencer, cuidar da explicitação de seu raciocínio, tratar opiniões/percepções como opiniões/percepções e não como fatos, etc.
E quem ouvia, tinha duas tarefas: fazer muitas perguntas para garantir que estava entendendo o que ouvia e refletir sobre o que podia fazer para aliviar essas dores da outra empresa, preparando-se para o último estágio do workshop.
Quinto estágio: planejar a cura conjuntamente
Após as apresentações, mapeamos em conjunto as áreas ou temas onde estavam os principais pontos de dor de cada empresa. Para cada área/tema, montaram-se então grupos misturados para definir ações que curassem ou que pelo menos minimizassem esses pontos de dor.
Os grupos trabalharam e apresentaram as suas sugestões. Redundâncias foram eliminadas, ações complementares foram juntadas, responsáveis foram escolhidos, um time conjunto de governança foi estabelecido... E como encerramento, cada executivo assumiu publicamente seu compromisso com a transformação da forma de trabalhar das duas empresas.
Este Workshop foi o primeiro passo do projeto de construção da aliança entre as empresas. Realizou-se dois meses depois outro workshop com o próximo nível de liderança e várias outras atividades nos meses seguintes. Seis meses após este primeiro workshop, a percepção de ambas as empresas é que a outra (e si mesmo) havia evoluído muito no seu espírito colaborativo, e resultados concretos já começavam a aparecer para ambos os lados.
